terça-feira, 8 de outubro de 2013

“O Livro dos Espíritos” – Reencarnação

Capítulo “Objectivo da Encarnação”

Qual o objectivo da encarnação dos Espíritos? [pergunta]
– A Lei de Deus lhes impõe a encarnação com o objectivo de fazê-los chegar à perfeição. Para uns é uma expiação; para outros é uma missão. Mas, para chegar a essa perfeição, devem sofrer todas as tribulações da existência corporal: é a expiação. A encarnação tem também um outro objectivo: dar ao Espírito condições de cumprir sua parte da obra da criação. Para realizá-la é que, em cada mundo toma um corpo em harmonia com a matéria essencial desse mundo para executar aí, sob esse ponto de vista, as determinações de Deus, de modo que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta.


Capítulo “A reencarnação”

A alma tem, portanto, que passar por muitas por muitas existências corporais? [pergunta]
 – Sim, todos nós temos muitas existências. Os que dizem o contrário querem vos manter na ignorância em que eles próprios se encontram. Esse é o desejo deles.

O número de existências corporais é limitado ou o Espírito reencarna perpetuamente? [pergunta]
 – A cada nova existência, o Espírito dá um passo no caminho do progresso. Quando se libertar de todas as suas impurezas, não tem necessidade das provações da vida corporal.

O número de encarnações é o mesmo para todos os Espíritos? [pergunta]
 – Não; aquele que caminha rápido poupa-se das provas. Todavia, essas encarnações sucessivas são sempre muito numerosas, porque o progresso é quase infinito.

Em que se torna o Espírito após a sua última encarnação? [pergunta]
– Espírito bem-aventurado; é um Espírito puro.*

* Na terminologia de “O Livro dos Espíritos”, refere-se aos anjos. [Nota minha]


Capítulo “Justiça da reencarnação”

Em que se baseia o dogma da reencarnação? [pergunta]
– Na justiça de Deus e na revelação, e repetimos incessantemente: um bom pai deixa sempre para os seus filhos uma porta aberta ao arrependimento. A razão não vos diz que seria injusto privar, para sempre, da felicidade eterna todos aqueles cujo aprimoramento não dependeu deles mesmos? Não são todos os homens filhos de Deus? Só os homens egoístas podem pregar a injustiça, o ódio implacável e os castigos sem perdão.

Todos os Espíritos estão destinados à perfeição, e Deus lhes fornece os meios de alcançá-la pelas provações da vida corporal. Mas, na Sua Justiça, lhes permite cumprir, em novas existências, o que não puderam fazer, ou acabar, numa primeira prova.
Não estaria de acordo nem com a igualdade, nem com a bondade de Deus condenar para sempre os que encontraram, no próprio meio em que viveram, obstáculos ao seu melhoramento, independentemente de sua vontade. Se a sorte do homem estivesse irrevogavelmente fixada após a morte, Deus não teria pesado as acções de todos numa única e mesma balança e não agiria com imparcialidade. [Allan Kardec]

Uma vez disse aqui, meio a sério meio a brincar, que a reencarnação é como um jogo de computador. Em cada existência a alma pratica, ganha pontos, aperfeiçoa-se, e, quando consegue, sobe de nível. À parte as devidas distâncias, continuo a pensar que é isto sem tirar nem pôr.
Não gosto do objectivo final: ser um anjo. Confesso que a minha noção dos seres angélicos não é a melhor mas talvez esteja equivocada. Entretanto, enquanto estou ou não equivocada, seja mesmo este o objectivo último ou outra coisa (outra coisa perfeita, semelhante a um anjo), quem é quer trabalhar por uma felicidade "pura e eterna" em que não acredita?
Erro de marketing. Se não é erro de marketing é pior; é tirania. Ou chegas cá pelo pau ou pela cenoura, mas chegas cá. À perfeição.
Talvez os participantes nas sessões espíritas transcritas n'"O Livro dos Espíritos", publicado em 1857, não fizessem a mais pálida ideia da impressão que isto causa a pessoas do século XX. Talvez ficassem entusiasmados, esperançosos, uma alternativa ao Céu e ao Inferno, uma doutrina rebelde para a mentalidade do tempo. Saliento que se diz que o Espírito encarna em muitos mundos, não apenas na Terra, assumindo vários tipos de corpos físicos, adaptados ao mundo em que encarna. Considerando a data de publicação, quer se acredite que foi ditado pelos espíritos ou não, e que não pretende ser ficção científica, nem sequer ficção, mas religião!, é espantoso! Absolutamente espantoso!
Mas a alma do século XX vê, em vez disto, campos de concentração, lavagens cerebrais, cultos e seitas nocivas, extermínio em massa dos desobedientes. O século XX assistiu ao Apocalipse e pior. Estava previsto? Que no século XXI considerássemos ingénua esta doutrina, porque também este é um nível? O nível em que não acreditamos em perfeição, pureza ou felicidade? Em que não acreditamos em "acreditar"?
Diria antes que gosto de acreditar nesta explicação, porque faz sentido para mim. É lógico, é racional. O que não quer dizer que concorde com o "processo", mas faz sentido.
Na verdade, foi a única explicação plausível que encontrei para a minha existência e não pretendo separar-me dela. Na altura em que li "O Livro dos Espíritos", depois dos 25 e antes dos trinta, compreendi que a minha é uma vida de expiação. Tive esperança de que a expiação servisse igualmente o propósito de se transformar também numa vida de missão. Mas aos quarenta anos já não tenho dúvidas. Não estou aqui para cumprir uma missão nem para desfrutar dos prazeres da existência terrestre. Estou na prisão. Tenho a sorte de escrever cartas cá para fora, mas sem dúvida estou na prisão.

Mais quando o assunto o proporcionar.






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