sexta-feira, 4 de outubro de 2013

“O Livro dos Espíritos” – O destino dos animais


Hoje, 4 de Outubro, é o Dia Internacional do Animal.



Capítulo “Os animais e o homem”

Se compararmos o homem e os animais sob o ponto de vista da inteligência, a linha de demarcação parece difícil de se estabelecer, porque alguns animais têm, sob esse aspecto, uma superioridade notória sobre alguns homens. Essa linha pode ser estabelecida de uma maneira precisa? [pergunta]
– Sobre esse ponto os vossos filósofos não estão de acordo em quase nada: uns querem que o homem seja um animal e outros que o animal seja um homem; todos estão errados. O homem é um ser à parte que desce muito baixo algumas vezes, ou que pode elevar-se bem alto. Fisicamente o homem é como os animais, e até menos dotado que muitos deles; a natureza deu aos animais tudo o que o homem é obrigado a inventar com a sua inteligência para satisfazer suas necessidades e sua conservação. É verdade que o seu corpo se destrói como o dos animais, mas o seu Espírito tem um destino que somente ele pode compreender, porque apenas o homem é completamente livre. Pobres homens que vos rebaixais além da brutalidade! Não sabeis vos distinguir? Reconhecei o homem pelo sentimento que ele tem da existência de Deus.


E quem diz que os animais não têm o sentimento da existência de Deus, se calhar maior, porque a terem-no será instintivo em vez de pensado e repensado? Quem é que o homem julga que é para saber o que sentem os animais só porque eles não falam (com o homem)?
Só porque eu não te falo de Deus não significa que eu não saiba o que é Deus. Posso achar que tu és demasiado limitado para me ouvires falar de Deus. 
E quanto àquelas pessoas mudas, surdas e cegas, que em tempos eram consideradas brutas como um animal porque não sabiam comunicar com outros humanos? Pode alguém dizer que essas pessoas não sabiam o que era Deus? Porque ninguém lhes ensinou o que era Deus? Nesse caso, igualmente não sabiam o que era o Amor, porque não conheciam a palavra para o Amor? Quem se atreve a insinuar que a espiritualidade tem que ser ensinada e não é inata?
Mais à frente os Espíritos dizem que o animal não conhece Deus. Se Deus nos passasse à frente, "disfarçado" ou invisível, e nós não o reconhecêssemos, quem nos garante que o animal, capaz de pressentir tempestades através de sentidos muito mais apurados que os nossos, não O reconheceria? Quem é o animal mais limitado, afinal?


Os animais têm livre-arbítrio de seus actos? [pergunta]
– Eles não são simples máquinas, como se pode supor; mas a sua liberdade de acção é limitada às suas necessidades e não se pode comparar à do homem. Sendo muito inferiores ao homem, não têm os mesmos deveres. A sua liberdade é restrita aos actos da vida material.

Se os animais têm uma inteligência que lhes dá uma certa liberdade de acção, há neles um princípio independente da matéria? [pergunta]
– Sim, e que sobrevive ao corpo.

Esse princípio é uma alma semelhante à do homem? [pergunta]
– É também uma alma, se quiserdes, depende do sentido que se dá a essa palavra; mas é inferior à do homem. Há entre a alma dos animais e a do homem tanta distância quanto há entre a alma do homem e Deus.


Sim! Os animais estão muito mais perto de Deus do que o homem alguma vez poderá estar.
Até por uma questão de lógica: os animais são as perfeitas criaturas, não questionam Deus. Não escrevem posts a duvidar da bondade de Deus. Não perguntam o porquê. Aceitam e existem e sofrem resignadamente. 
Pergunto mesmo: seria isto que Deus queria do Homem também?...


A alma dos animais conserva, após a morte, a sua individualidade e a consciência de si mesma? [pergunta]
– A sua individualidade, sim, mas não a consciência do seu eu. A vida inteligente continua no estado latente.

A alma dos animais tem a escolha de encarnar num animal em vez de outro? [pergunta]
– Não; ela não tem o livre-arbítrio.

A alma do animal, sobrevivendo ao corpo, estará, depois da morte, na erraticidade, como a do homem? [pergunta]
– É uma espécie de erraticidade, uma vez que não está mais unida ao corpo, mas não é um Espírito errante. O Espírito errante é um ser que pensa e age de acordo com sua livre vontade; o dos animais não tem a mesma faculdade. A consciência de si mesmo é que constitui o atributo principal do Espírito. O espírito do animal é classificado após a sua morte pelos Espíritos a quem compete essa tarefa e quase imediatamente utilizado; não há tempo de se colocar em relação com outras criaturas.

Os animais seguem uma lei progressiva, como os homens? [pergunta]
– Sim, por isso, nos mundos superiores, onde os homens são mais avançados, os animais também o são, tendo meios de comunicação mais desenvolvidos; mas são sempre inferiores e submissos ao homem, são para ele servidores inteligentes.

“Servidores inteligentes”: tenho para mim que este Espírito nunca conheceu um gato.


Os animais progridem, como o homem, pela acção da sua vontade ou pela força das coisas? [pergunta]
– Pela força das coisas. É por isso que para eles não há expiação.

Nos mundos superiores, os animais conhecem Deus? [pergunta]
– Não; para eles o homem é um deus, como antigamente os Espíritos foram deuses para os homens.

E como os animais foram deuses para os homens.


Os animais, mesmo os aperfeiçoados nos mundos superiores, são sempre inferiores ao homem. Isso significa que Deus teria criado seres intelectuais perpetuamente destinados à inferioridade, o que parece estar em desacordo com a unidade de vistas e de progresso que se distingue em todas as suas obras. [pergunta]

Grande pergunta!


– Tudo se encaixa na natureza pelos laços que não podeis ainda compreender, e as coisas mais desiguais na aparência têm pontos de contacto que o homem nunca chegará a compreender na sua condição actual. Ele pode entrevê-los pelo esforço da sua inteligência, mas somente quando essa inteligência tiver adquirido todo o desenvolvimento e estiver livre dos preconceitos do orgulho e da ignorância é que poderá ver claramente a obra de Deus. Enquanto isso não acontece, suas ideias limitadas lhe fazem ver as coisas sob um ponto de vista mesquinho e restrito. Sabei bem que Deus não pode se contradizer e que tudo, na natureza, se harmoniza pelas leis gerais que nunca se afastam da sublime sabedoria do Criador.

Assim, pode-se considerar que a alma teria sido o princípio inteligente dos seres inferiores da Criação? [pergunta]
– Não dissemos que tudo se encadeia na natureza e tende à unidade? É nesses seres, que estais longe de conhecer inteiramente, que o princípio inteligente se elabora, individualiza-se pouco a pouco e ensaia para a vida, como já dissemos. É, de algum modo, um trabalho preparatório, como a germinação, em que o princípio inteligente sofre uma transformação e torna-se Espírito. É então que começa o período de humanização e com ela a consciência do seu futuro, a distinção entre o bem e o mal e a responsabilidade de seus actos. Assim como depois da infância vem a adolescência, depois a juventude e, enfim, a idade adulta. Não há, além disso, nessa origem nada que deva humilhar o homem. Será que os grandes génios se sentirão humilhados por terem sido fetos em formação no seio da sua mãe?
Se alguma coisa deve humilhá-lo é sua inferioridade perante Deus e sua impotência para sondar a profundidade dos seus desígnios e a sabedoria das leis que regem a harmonia do universo. Reconhecei a grandeza de Deus nessa harmonia admirável que faz com que tudo seja solidário na natureza. Acreditar que Deus pudesse fazer alguma coisa sem objectivo e ter criado seres inteligentes sem futuro seria blasfemar contra a sua bondade, que se estende sobre todas as suas criaturas.

A bondade de Deus! Não blasfememos contra a bondade de Deus que criou seres destinados a milhões e milhões e milhões de reencarnações em que sofrem a dureza dos elementos e a crueldade da natureza, e a crueldade e insensibilidade do homem, sendo maltratados, caçados, abatidos, torturados, comidos, por outros animais e pelo homem. Seres destituídos de inteligência suficiente para se revoltarem ou acusarem, ou sequer compreenderem.
A bondade de Deus.


Esse período de humanização começa na Terra? [pergunta]
– A Terra não é o ponto de partida da primeira encarnação humana; o período de humanização começa, em geral, nos mundos ainda mais inferiores; entretanto, essa não é uma regra geral, e poderia acontecer que um Espírito, desde o começo da sua humanização, estivesse apto a viver na Terra. Esse caso não é frequente; é, antes, uma excepção.

Capítulo “Metempsicose”

O Espírito que animou o corpo de um homem poderia encarnar num animal? [pergunta]
– Isso seria retroceder e o Espírito não retrocede. O rio não retoma à sua fonte.


Conclusão, os animais têm uma alma que sobrevive à morte. Os seres humanos não reencarnam como animais (não retrocedem). O destino e progressão da alma dos animais é incerto e misterioso, mas existe. Nunca se diz que alguns animais não atinjam a progressão suficiente para serem homens. Talvez isto explique a quantidade de bestas de duas patas que acabaram de sair do animal e são agora humanos (há muito pouco tempo). Enquanto não evoluírem, continuarão a ser bestas, por muito humanos que sejam em aparência. O mundo está cheio deles.
(Talvez não seja exactamente assim que acontece a progressão dos animais, mas era uma boa explicação para o fenómeno.)

Tenho mais a dizer sobre o assunto. Escrevi o parágrafo acima numa intenção meramente crítica e impregnada do sarcasmo habitual. Mas depois pensei melhor sobre o assunto. O que distingue o homem do animal é a consciência moral, isto é, a capacidade de conhecer o Bem e o Mal (o que não é a mesma coisa que conhecer Deus; Deus podia nem existir e continuaríamos a conhecer o Bem e o Mal). O animal não tem esta consciência moral que só o intelecto permite desenvolver, age por instinto, mata e come sem remorso porque nunca questiona o Bem e o Mal dos seus actos. Nem poderia questionar porque o seu intelecto não é a esse nível desenvolvido. Imaginemos, pelo exercício que proporciona, colocar uma alma animal, amoral e instintiva, num corpo humano com um cérebro superior. Teremos um monstro. O que antes era natural e instintivo, mas desculpável pela falta de intelecto, torna-se agora, inteligente mas sem consciência moral, numa criatura capaz de tudo para satisfazer os seus apetites, inclusivamente matar, sem remorsos nem compaixão nem capacidade de sentir empatia. E temos aqui a definição de sociopata. Isto fez-me pensar.
Não me chocaria que o sociopata fosse as primeiras encarnações do animal no homem, mas já não animal porque já homem, e já não necessitando de protecção porque intelectualmente desenvolvido para se defender a si mesmo. Logo, definitivamente já não animal. Mas, sem consciência moral, já inteiramente homem? É uma pergunta que tenho feito a mim mesma e considerado que é perigoso responder-lhe, com ou sem reencarnação.
Mas uma questão pertinente quando se discute a superioridade e/ou inferioridade do homem e do animal.

Seria verdadeira a ideia da metempsicose se ela se definisse como sendo a progressão da alma de um estado inferior a um estado superior em que adquirisse desenvolvimentos que transformassem sua natureza. Porém, é falsa no sentido de transmigração directa do animal para o homem e vice-versa, o que dá ideia de um retrocesso ou de uma fusão (…)
O ponto de partida dos Espíritos é uma dessas questões que se ligam ao princípio das coisas e que estão nos segredos de Deus. Não é permitido ao homem conhecê-lo de maneira absoluta, e ele somente pode fazer a esse respeito suposições, construir sistemas mais ou menos prováveis. Os próprios Espíritos estão longe de conhecer tudo; sobre o que não sabem podem também ter opiniões pessoais mais ou menos sensatas.
É assim, por exemplo, que nem todos pensam a mesma coisa a respeito das relações que existem entre o homem e os animais. Segundo alguns, o Espírito só alcança o período de humanidade após ter sido elaborado e individualizado nos diferentes graus dos seres inferiores da Criação; segundo outros, o Espírito do homem teria sempre pertencido à raça humana, sem passar pela experiência animal. (…)
Quanto às relações misteriosas que existem entre os homens e os animais, está aí, nós repetimos, o segredo de Deus, como muitas outras coisas cujo conhecimento actual não importa ao nosso adiantamento e sobre as quais seria inútil insistir.
[Allan Kardec]


Penso que por esta altura já seria muito útil ao nosso adiantamento, quando já alguém disse que o desenvolvimento de uma civilização se pode medir pela maneira como se tratam os animais (posterior a Kardec).
Achei engraçado quando Kardec diz dos Espíritos: "Segundo alguns, o Espírito só alcança o período de humanidade após ter sido elaborado e individualizado nos diferentes graus dos seres inferiores da Criação; segundo outros, o Espírito do homem teria sempre pertencido à raça humana, sem passar pela experiência animal."
Imagino as discussões acaloradas durante essas sessões de espiritismo do século XIX, e ainda não tinham chegado "lá acima" os darwinistas!
Se a teoria de que o homem podia ter evoluído do macaco já fazia impressão a muita gente, esta ideia que defende que as origens do Espírito (mais importante porque ainda de maiores implicações religiosas do que a evolução do corpo) começam numa fase pré-humanização, isto é, que o Espírito já foi menos do que homem, talvez até menos do que animal, era uma ideia que não podia ter muitos amigos.
Esta parte das respostas dos Espíritos não é clara. Insinua-se que o (pré-)espírito do homem animou o animal (ou menor que isso) antes de ser um Espírito humano, mas nunca revela mais do que aquilo que transcrevi.





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