domingo, 25 de novembro de 2012

Gotika: arquivos Janeiro 2004

janeiro 12, 2004

Ainda a definição de “gótico”

Disse Alma: “Até hoje ainda não tinha lido uma definição tão clara :) acerca dos góticos. É incrivel como poderemos ser incompreendidos ...” e disse Anubis: “Acho que a tua definição de gótico é excelente e muito esclarecedora.O facto das pessoas "normais" não nos compreenderem e aceitarem na nossa diferença é de facto horrível”.

Obrigada pelas palavras simpáticas mas as minhas tentativas de descrever, não definir, o gótico, ainda se ficam pelos apontamentos soltos aqui e ali, conforme me for lembrando.
É difícil definir um movimento ao qual próprios elementos negam pertencer. Daí que, quando falamos no conjunto, seja possível apenas expor os traços gerais. Os góticos já são bastante individualistas por natureza e gostam muito de pensar que são únicos e indefiníveis. A arrogância também é um traço geral. ;)

Quanto a serem incompreendidos, não sei se concorde. Não sei se os góticos são mais ou menos incompreendidos do que os outros grupos sociais. A verdade é que pouca gente se esforça por compreender seja o que for que fique fora do seu pequeno mundo. Se há preconceitos sobre os góticos, também os há sobre outros grupos sociais. Porque havemos de dizer que os góticos são incompreendidos? Não o somos todos?...

Publicado por _gotika_ em 07:11 AM | Comentários: (2)


Aula de comunicação

Agora que fiz a boa acção do mês já posso ser mázinha à vontade.

Vem isto a propósito do comentário deixado por scumofthehearth ao post “Outra consideração sobre o movimento gótico - to be or not to be?”, que reza assim:

“ai ai... olha lá.... e se andassemos todos nus? hein?”

Olha a porta a que vieste bater! Eu até faço topless na praia. Naturismo não, porque ainda não calhou. Talvez um dia.

Mas isto levanta considerações de ordem mais abrangente e cultural, por isso listen to me carefully, I shall say this only once. Depois da dissertação socio-historico-antropológica que vou dar a seguir, se alguém voltar a deixar comentários imbecis sobre a roupa que as pessoas vestem, será imediatamente chamado de inculto, ignorante e estúpido. Estou a avisar.
É que nem é preciso um curso superior para aprender isto. Eu estudei esta matéria no liceu, antes do 12º ano. O que andaram lá a fazer? A tirar macacos do nariz e a colar nas carteiras? Tanta ignorância é culpa vossa, por isso é imperdoável. Não terei misericórdia.

A roupa que as pessoas vestem é uma convenção social. No princípio, o homem andava nu. Não me refiro ao princípio bíblico, à história do Adão, da parra e da serpente. Não. O homem (homo sapiens) andava nu porque teve origem nas savanas de África. Sabiam, não sabiam, que todos nós somos africanos e que por isso o racismo é disparate?... Claro que sabiam. São muito cultos. Nas savanas de África, dizia eu, o homo sapiens preocupava-se em procurar alimento e água, não em cobrir o corpo. Tal como os animais, andava em liberdade, aproveitando o clima quente do continente. Devido à desertificação, o nosso antepassado viu-se forçado a migrar para Norte, onde o clima era mais frio, e começou a cobrir-se com as peles dos animais caçados. Não por vergonha, mas mesmo por ter frio. Criatura inteligente e espiritualmente desenvolvida, inventou uma coisa chamada “adorno” e uma coisa chamada “pintura corporal” para usar e mostrar o seu estatuto dentro da comunidade. Com o desenvolvimento destas estruturas rudimentares de civilização, passou a ser proibido aos caçadores usarem os adornos e pinturas dos feiticeiros da tribo, e vice versa. Feitos de ossos de animais e pedras esmagadas, estes adornos e pinturas tornaram-se numa forma de linguagem não verbal que ainda hoje existe. A certa altura, deixou de ser importante usar roupa por estar frio mas sim porque a roupa usada descrevia de forma inequívoca o estatuto social de quem a usava. Por exemplo, o rei usava coroa, e não era para proteger a cabeça. Ninguém mais a podia usar, só o rei.
A roupa que se veste faz parte da comunicação não verbal entre seres humanos. A comunicação não verbal é mais vasta e mais importante do que a própria comunicação verbal, e engloba a roupa, o penteado, o cheiro, os gestos, as expressões faciais e corporais, o tom de voz, etc. Todos nós lhe damos mais importância do que àquilo que as pessoas dizem. Um exemplo rápido e tosco: uma pessoa pode falar muito bem mas se chegamos ao pé dela e cheirar a suor, provoca em nós um impacto mais negativo do que uma pessoa que não sabe falar mas não cheira mal. A comunicação não verbal tem as mesmas regras da comunicação verbal. É a sociedade que as define. Na Escócia, os homens usam kilt. No Oriente, a cor do luto é o branco. Regras sociais, nada mais. A nossa aparência diz mais de nós do que as próprias palavras, quer queiramos quer não. Pela aparência conseguimos determinar quase imediatamente a classe social, o estatuto, a profissão, a idade, a personalidade e até a nacionalidade do indivíduo. As tribos urbanas como o gótico e o freak, por exemplo, permitem até determinar que tipo de música a pessoa ouve. Se formos ao pormenor dos adornos, se usa uma cruz ou uma cruz invertida, ou determinado símbolo, até conseguimos perceber aquilo em que a pessoa acredita.
Os grupos e os sub-grupos vão determinando as regras desta comunicação até que por vezes as palavras são desnecessárias. Não porque sejam telepatas (como dizia outro comentário “inteligente”) mas porque a profusão de símbolos utilizados já formam um discurso bastante elaborado sobre a personalidade de cada um. Discurso esse que só é compreensível pelos membros do mesmo grupo, que conhecem as regras da sua linguagem interna.

Isto passa-se nas empresas, nas famílias, nas nações, nos grupos de amigos, nos grupos religiosos, enfim, em todo o lado.

Agora não me deixem mais comentários idiotas sobre a roupa, ou conhecei a minha ira.

Vamos é aos temas verdadeiramente interessantes.

Publicado por _gotika_ em 06:55 AM | Comentários: (7)

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