terça-feira, 30 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 28, 2003

Manifesto existencial

É engraçado como raramento falo deste poema. Penso que até o sei de cor, que versos dele me ocorrem ao pensamento todos os dias, que está gravado no meu ADN para lá de qualquer hipótese de escolha. É a base da minha pizza, se podemos brincar com coisas sérias. Não se pôe em questão. Não se liga àquela parte da sociedade que sempre verá heresia nestas palavras. É como é, sou como sou, somos como somos, e alguém o escreveu em poesia. Fica aqui, mais uma vez, até para o dar a conhecer às gerações mais novas que não o estudam na escola.


Cântico Negro
José Régio

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces,
estendendo-me os braços, e seguros
de que seria bom que eu os ouvisse
quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
e cruzo os braços,
e nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
-Que eu vivo com o mesmo sem vontade
com que rasguei o ventre a minha mãe.

Não, não vou por aí! Só vou por onde
me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
por que me repetis: "vem por aqui"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
redomoinhar aos ventos,
como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
a ir por aí...

Se vim ao mundo,
foi só para desflorar florestas virgens,
e desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
que me dareis impulsos, ferramentas, e coragem
para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
e vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! tendes estradas,
tendes jardins, tendes canteiros,
tendes pátrias, tendes tectos.
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca princípio nem acabo,
nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
-Sei que não vou por aí!

Publicado por _gotika_ em 11:32 PM | Comentários: (5)

domingo, 28 de outubro de 2012

A Däkar Monsalbant:

Cara Däkar Monsalbant,
se ainda me estiver a ler, este post é para você, porque mais vale tarde do que nunca.
Enviou-me um link para sua escrita e não respondi. Não ficou esquecido. Não ignorei. Dei uma passadela de olhos, o que aqui chamamos "ler na diagonal", e percebi que tinha de ler com mais atenção para poder exprimir uma opinião ou escrever sobre o que tinha lido. Não tive tempo antes de ontem. Ontem tentei visitar os links que me mandou mas estão fechados ao público em geral. Tentei responder ao seu email mas o endereço electrónico já está desactivado. Se ainda o desejar, e se estiver a ler isto, terei todo o gosto em fornecer-lhe uma opinião, em privado ou em público, como quiser, porque nestas coisas sou muito sensível à vontade das pessoas.
Para começar, posso dizer-lhe que achei que era preciso ler com atenção, o que é um bom começo.
Se o desejar, escreva-me novamente ou deixe o link aqui mesmo nos comentários.

Felicidades e continuação de bom trabalho.

sábado, 27 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 27, 2003

Filmes

Como já devem ter percebido, estou a tentar comentar os filmes que passam na televisão, aqueles que valem a pena. Hoje passou um grande filme, se bem que não um filme recente. "A vida é bela", um filme italiano sobre o nazismo, que mostra que a vida é tudo menos bela.
O melhor comentário que posso fazer ao filme nem sequer é meu mas de alguém que disse "a certa altura não sabia se havia de rir ou chorar". Expressa muito bem a minha visão do mundo, este filme, porque insisto em rir das tragédias embora uma tragédia não deixe de ser uma tragédia. Mas como aquele pai ansiava por proteger o filho da realidade que o rodeava, assim também eu penso que o melhor é rir... Embora... Muito embora... da primeira vez que vi o filme havia já uma lágrima a escapar-me do canto do olho (penso que foi quando o pai morreu) mas aquela cena do tanque a chegar e o puto a dizer "é verdade!" me tenha feito dar logo uma gargalhada. Ora bolas, não há ninguém tão corajoso como aquele homem! (Digo eu, cobarde que penso que sou.)
E enfim, génios não nascem todos os dias e Roberto Benigni não é apenas um génio como também um génio que nos faz rir, até num contexto de um campo de concentração nazi, o que só por si é genial.
Eu não sou pessoa de chorar com filmes. Choro com a realidade e às escondidas. Já agora falo de outro grande filme que passou há pouco tempo na televisão. Fui ver o "Titanic" ao cinema para apreciar aquela grande imagem do navio a afundar a pique, no já extinto São Jorge. A meio do filme, antes do intervalo, saí para fumar um cigarro porque o filme já enjoava de tédio. Fui à casa de banho, voltei, e espreitei pela janelinha da porta. Estavam o Leonardo de Caprio e a Kate Winslet num carro a fazer amor. E eu pensei, "porra, mas o barco nunca mais afunda?". O senhor dos bilhetes viu-me a espreitar e disse, todo simpático: "Pode entrar, pode entrar!", e eu: "Mas eu não quero, eu estou só... Estou só à espera do meu amigo... Do intervalo..." Por aqui podem ver que de facto não me comovo com tudo e alguma coisa. Quando eu digo que me comovo, malta, é a sério! E quando eu digo que "A vida é bela" me pôs uma lágrima nos olhos e que esta lágrima caiu no riso dos meus lábios, é a sério também. Grande, grande filme! Maior que a vida.

Publicado por _gotika_ em 08:52 AM | Comentários: (3)


Mais uma opinião pessoal sobre o movimento gótico

Penso que os góticos têm uma alma artística. Pelo menos todos gostam de música ou não andariam nisto. Nada de polémico até aqui, penso eu.
É por isso, certamente, que se vestem e pintam de maneira diferente. E não há um estilo igual ao outro. Todos personalizam o seu estilo de acordo com a sua noção de belo (ou de feio - porque há aqueles que insistem em realçar a beleza do horrível).
Lembro-me de estar uma vez a apanhar o autocarro da madrugada, e um dos meus "co-estilísticos" ter entrado antes de mim, e ouvir alguém dizer dele atrás de mim: "interessante, veste-se à século dezanove".
E de facto é interessante. Porque não havemos de vestir-nos à seculo XIX se é isso que nos vai na alma? Porque é que temos de ser escravos da moda? Aí está uma questão que me atormenta. Lá está, a alma artística.
A maioria dos góticos pinta ou escreve ou faz música ou desenha roupa ou molda potes de barro à mão, enfim, faz arte. No mínimo, gosta de uma arte que é a música. Imaginem qual é a minha. ;)
OK, não é difícil imaginar que escrevo, mas também desenho roupa, e faço web design, e sei lá que mais. Por isso é que este blog nunca está pronto e nunca está satisfatório. Há sempre tanto a fazer!...
E pronto, por hoje chega de elogios aos góticos. Quando for preciso cortar na casaca estou perdoada. E se for preciso cortar na casaca, podem crer que cortarei sem dó nem piedade. Mas hoje não estou para aí virada.

Publicado por _gotika_ em 08:03 AM | Comentários: (0)


Reconstructions

A imagem de topo foi alterada. Dêem-me um vestido branco. Às vezes o branco é mais negro do que o próprio negro.

Publicado por _gotika_ em 07:32 AM | Comentários: (0)


_-_Errata_-_

Quando eu disse, no post anterior, "o tal “dark side of the Force” para os star trekkers", enganei-me. Queria referir-me, obviamente, aos fans dos "Star Wars" e não exactamente do "Star Trek", embora muitas vezes coincidam. Sorry.

Publicado por _gotika_ em 01:51 AM | Comentários: (0)

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003


dezembro 26, 2003

Eu, Gótica

Perguntaram-me, num comentário, o que é ser gótico. Peço perdão, culpa minha, não me apresentei! Tencionava fazê-lo mas não surgia a oportunidade adequada... Mas quem me perguntou o que é ser gótico não imagina o berbicacho em que me meteu. Já explicarei porquê.
Começo antes por explicar o título do blog. Como é um diário pessoal, resolvi ir buscar o adjectivo que mais vibra na minha alma, que mais me identifica perante mim própria e perante os outros. A sociedade em geral, e os amigos em particular (os não-góticos), é que começaram a identificar-me assim, “aquela, a gótica”. A brincar, a brincar... E começa assim. O gótico é identificado pelo resto da sociedade, geralmente pelo que veste e pelo que ouve, por isso não vou perder-me aqui a descrever a roupa e a música gótica. Aliás, no caso da música, começar a classificar categoricamente “isto é gótico, aquilo não é gótico” era pedir sarna para me coçar ou, em inglês, to open a can of worms, e não estou de facto para isso. Posso expressar a minha opinião sobre uma banda ou outra, noutro contexto, mas não para explicar o que é ser gótico. Fiquem descansadinhos, seres das trevas, irmãos, companheiros, palhaços, que não vou por aí. Nem sequer vou falar de música neste post.
Vou falar da alma gótica inserida no contexto do movimento gótico actual. E perante o contexto gótico actual (que teve o seu início no começo da década de 80), saliento o que é logo à partida, da minha parte, uma contradição gritante. A primeira regra do gótico, REGRA NÚMERO UM!, é que o gótico nunca assume que é gótico. Não me perguntem porquê, mas É assim. Ponto final. A quem diz que é gótico, dentro do movimento, é chamado poseur, o que é a pior coisa que podem chamar a um gótico: fingir ser gótico pelo que veste e o que ouve só para se sentir parte do grupo. E eu concordo. Há muitos putos e pitas assim. Mas esses desaparecem depressa, assim que tomam juízo. Ser gótico não é bom para ninguém, é uma mais maldição. Uma maldição saborosa mas uma maldição.
Porque é que eu me dou ao luxo de assumir? Pois, porque sou velha. Porque não tenho as inseguranças da adolescência. Na adolescência, a maioria das pessoas são góticas. Inadaptado, solitário e deprimido, o adolescente pensa “quem sou? o que faço aqui? ninguém me ama. não pertenço a sítio nenhum. sou um desgraçado. quero morrer.” A maioria das pessoas, como eu disse, passa por isso. Penso até que é uma fase saudável, de aprendizagem, de socialização, um rito de passagem. No fim da adolescência, o jovem adulto ultrapassou estas inseguranças, encontrou-se, e encontrou o seu lugar no mundo e na sociedade.
Agora poderia começar a dissertar sobre o que é ser gótico aos 30 anos, mas não vou fazê-lo. Não hoje. Este post é mais geral. E aqui entra-se no berbicacho. Com certeza já viram entrevistas e reportagens sobre góticos e se há alguma coisa em que os góticos concordam é que o gótico é subjectivo.
Por isso mesmo, ao falar do movimento gótico estou a assumir um risco, estou a ser provocadora. Tentarei ter tento na língua. Opinião pessoal, portanto, é que os góticos têm um sistema de regras e de hierarquia semelhante ao mito do vampiro. - Respeitam-se os mais velhos. Andam nisto há mais tempo. E não se fala sobre os segredos da comunidade. Nem esperem que vos conte todos, isso é que era bom. Afinal, eu também faço parte dela... É preciso ter segredos. Só os segredos nos permitem identificar-nos uns aos outros. É uma espécie de sociedade secreta. Eu juro que não queria entrar na paródia, mas às vezes é difícil. É mesmo preciso ser gótico e pertencer à comunidade para identificar o que é paródia e o que não é. Vão ter de me perdoar. - Como eu dizia, voltando ao mito do vampiro, e sem querer dizer que todos os góticos gostariam de ser vampiros porque alguns fogem à regra, se lerem as crónicas do vampiro Lestat (Anne Rice) perceberão a raiva que a comunidade vampírica tem desse ser provocador que se atreve a escrever sobre os outros vampiros. Pois, meus amigos em geral, é mesmo assim. Um gótico não expõe os outros. A não ser que seja do tipo do Lestat... Adivinhem de que tipo sou eu... *cough, cough*
Pronto, não falo mais em vampiros, juro! *dedos cruzados atrás das costas porque pode vir a dar jeito outra metáfora do género*
Vamos então à alma gótica e dissequemo-la.
No tal contexto dos anos 80, o gótico veste-se de uma determinada maneira e ouve um certo tipo de música. Ponto assente. (Eu também visto, e eu também ouço)
Mas a alma gótica nasceu nos anos 80? Isso é que era bom! Então e Egdar Allan Poe? Então e Florbela Espanca? Opinião pessoal: eram góticos e não sabiam. Outros sabiam, no século XIX, em que a literatura se deliciou com novelas assumidamente góticas. E não me parece que as jovens donzelas do século do romantismo fossem para os bailes vestidas de preto...
Nestes anos todos, o que eu tenho notado em comum com toda a gente que gosta do movimento e esteve nele para ALÉM da adolescência, tirando a música e as roupas, tirando o gosto pela noite, tirando uma certa “doença de viver” que pode ou não ser uma depressão mais ou menos grave, o que eu vejo mesmo é que os góticos são pessoas que não têm medo de pensar no lado negro da vida. O tal “dark side of the Force” para os star trekkers. O “dark side of the moon” para os pink floyders. Não tentam fingir que a noite - e o dia - é um espaço para esquecer os problemas. Daí que muita gente os acuse do culto da depressão. Eu não concordo com essa do “culto da depressão”. É uma opinião pessoal e vale o que vale mas não acho que seja boa política ir para a noite (ou para o dia) fingir que está tudo bem e que estamos muito contentes quando não estamos.
Aliás, o que me atraiu na cultura gótica foi o facto de que podia estar sentada a um canto a noite toda sem sorrir nem dizer nada a ninguém e as pessoas respeitavam esse estado de espírito. Ainda respeitam. Não preciso estar a fingir que estou bem disposta. Há quem lhe chame “culto da depressão” mas eu chamo-lhe não estar a fingir. Enfim, já tenho idade para confrontar esses senhores e desafiá-los “e vocês querem dizer-me que vão para as Docas a sorrir porque são muito felizes?...” Fingidos.
Não concordo que se fique em casa a curtir a depressão sozinho como faz a maioria só porque as outras pessoas não gostam de ver tristezas. Viram aquele filme, “A Praia”? Foi um filme que me chocou. Lembram-se daquela parte em que estava um homem a morrer com gangrena e o mandaram embora das suas vistas para que a morte não lhes perturbasse a festa? É o que faz a sociedade em geral. Fiquei chocada, admito, mas porquê se o vejo todos os dias? É preciso sorrir, é preciso “estar contente”. Nem que seja a fingir.
Rejeito. Oponho-me. Dou cabo das vossas festas. Aliás, para não dar cabo das vossas festas junto-me a outras pessoas que não se importam de me ver a um canto de vez em quando, tal como eu respeito quando os outros precisam de estar a um canto.
Nem todos os góticos são sensíveis, atenção! Há por lá autênticas bestas. Nem todos os góticos são místicos. Por isso eu dizia que uns vão mais longe que outros. Muitos góticos são cultos porque a música gótica tem tendência para as referências literárias, mas nem todos o são!
Outra coisa, a atracção pela morte. O tal factor X que leva as pessoas a interessarem-se pelo oculto, a perguntarem-se se há algo para além disto, a adoptarem esta ou aquela religião... Outro mito acerca dos góticos é que amam a morte. Não é bem assim. Como eu disse, e aqui está a chave, os góticos são pessoas que não têm medo de olhar para os aspectos menos positivos da vida. Incluindo a morte. Comparando com a maioria da pessoas, para quem a morte é um tabu impronunciável, até parece que amam a morte só porque pensam nela, falam sobre ela e têm-na presente. A música gótica (penso que este ponto não é polémico) tem na morte uma grande fonte de inspiração. Logo, se gostamos de ouvir canções que falam na morte, amamos a morte? Não. Simplesmente não a ignoramos, não fingimos que ela não existe. E só isso. E isso chega para fazer confusão a muita gente.
Pelo facto de estarem conscientes também da morte, muitos góticos se tornam místicos. Há-os pagãos, cristãos, satânicos... agnósticos e ateus. Como o resto da sociedade. A perspectiva é que é diferente. Deixa de ser “não vou pensar nisto porque tenho medo” para ser “até posso ter medo mas se isto existe o melhor é pensar no assunto”.
A partir daí, a forma como cada um encara a existência é de facto muito pessoal. Eu tenho a minha. Outros terão outra. É natural.

Haveria muito mais para dizer acerca do gótico, da cultura gótica, do movimento gótico, mas a partir daqui é a minha opinião pessoal e não aquilo que salta à vista. A partir daqui entramos no subjectivo. Na opinião de muitos góticos até já entrei, mas que se lixe. É assim que eu vejo a coisa.
Não quero que fiquem com a ideia, porém, que os góticos são um bando de gente depressiva. Ok, até podem ser, mas têm os seus momentos de alegria. Estar consciente das coisas más não é sinónimo de estar triste. Muitos de nós (góticos) fazem paródia disto, dizendo que o verdadeiro gótico é aquele que acorda a chorar e adormece a chorar e ainda por cima tem pesadelos, mas isso é paródia. Como é paródia dizer que o gótico é aquele que escreve poesia num papel negro, debaixo de uma luz negra, com uma caneta de tinta preta. Pode escrever poesia com caneta preta sob uma luz negra, mas bolas!, o papel tem que ser branco senão não vê o que escreve! E daí... qual é o mal de escrever para ninguém ver? Foi o que eu fiz muitos anos.
Enfim, gótica.

Publicado por _gotika_ em 04:47 AM | Comentários: (5)


Filmes

Pois é, nunca tinha visto o "Harry Potter", muito menos lido os livros. Se eu fosse miúda era capaz de ficar pottermaníaca, tenho a certeza. Nestas alturas é que eu gostava de ter filhos, para eles verem. Não podia desmamá-los com "As Brumas de Avalon" ou "O Exorcista", pois não? Tínhamos de começar por uma coisa mais levezinha. Um Harry Potter.
Quase me apetece dizer "gostava de voltar a ser criança" mas por razões de vária ordem de facto não, não gostava de voltar a ser criança.
No meu tempo não haviam pequenos feiticeiros. Haviam grandes feiticeiros e bruxas a sério. Agora parece que nem o Lobo Mau come a avó do Capuchinho Vermelho, limita-se a fechá-la no armário. O que eu acho um disparate. O Lobo Mau comeu a avózinha e deve continuar a comê-la para todo o sempre. O lenhador não deve correr com o lobo mas sim matá-lo e abrir-lhe a barriga, de onde sai a avózinha. Vivemos num mundo cada vez mais violento mas somos cada vez mais hipócritas a ensinar as crianças. Se calhar porque não queremos admitir que deixámos o mundo chegar ao que chegou... Mas o mais importante é isto: como é que as crianças se podem proteger se não souberem que o Mal existe, que o Mal pode estar em cada esquina e mesmo, infelizmente, dentro de casa?
De modo que achei o "Harry Potter" um bocado leve de mais. Podia ser um bocadinho mais assustador... Só um bocadinho.

Nota: Por falar no Capuchinho Vermelho, deixo aqui um elogio àquele filme fantástico que é "A Companhia dos Lobos". Não aconselhável a crianças, mas se as crianças virem também não percebem nada por isso mal não faz...

Publicado por _gotika_ em 02:41 AM | Comentários: (0)

domingo, 21 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 25, 2003

Filmes

A série "As Brumas de Avalon", que passou agora na RTP1, não faz justiça ao livro de Marion Zimmer Bradley. Mas também o que é que eu esperava? São quatro volumes bem espessos! Muitas passagens importantes foram pura e simplesmente omitidas. De todas, a mais importante foi o período de tempo em que Morgaine se perdeu na floresta e viveu no mundo das Fadas. Salvo erro, quando ela deixa o filho com Morgause e se dirige a Camelot. Na história, Morgaine permanece no mundo das fadas durante tantos anos que quando volta a Camelot já todos tinham envelhecido menos ela.
E, perante a decadência de Avalon e o esquecimento a que vê votada a religião antiga, Morgaine assume a sua missão e torna-se a última Senhora do Lago. Pelo menos respeitaram o final, quando ela reconhece a Deusa na Virgem Maria. Uma visão polémica em país católico mas os factos têm muita força. O culto mariano foi a forma que o cristianismo encontrou para desviar a adoração pagã da deusa mãe para Maria mãe de deus.
Misticismo à parte, "As Brumas de Avalon", o livro, é de leitura obrigatória para qualquer mulher. E para qualquer homem que queira compreender a alma feminina. Aconselho vivamente.

Publicado por _gotika_ em 05:58 PM | Comentários: (0)

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 23, 2003

«O olhar de um gato é sempre um universo de pensamentos puros»


"Flower Cats", Louis Wain

Publicado por _gotika_ em 01:37 AM | Comentários: (0)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 22, 2003

Imensidão




Uma canção

Ray Of Light
Madonna "Ray of Light" 1998


Zephyr in the sky at night I wonder
Do my tears of mourning sink beneath the sun
She's got herself a universe gone quickly
For the call of thunder threatens everyone


And I feel like I just got home
And I feel
And I feel like I just got home
And I feel

Faster than the speeding light she's flying
Trying to remember where it all began
She's got herself a little piece of heaven
Waiting for the time when Earth shall be as one


Quicker than a ray of light
Quicker than a ray of light
Quicker than a ray of light


And I feel
Quicker than a ray of light
Then gone for
Someone else shall be there
Through the endless years

She's got herself a universe
She's got herself a universe
She's got herself a universe

And I feel
And I feel
And I feel like I just got home
And I feel

Quicker than a ray of light she's flying
Quicker than a ray of light I'm flying

*********************

Sim, eu sei que não ando a publicar canções muito góticas, e que um gótico dificilmente se descreverá como um "ray of light". Será mais um raio de escuridão. Mas ultimamente tenho-me sentido muito identificada com a letra desta canção, principalmente a parte "she's got herself a universe".
Madonna é uma mulher que conseguiu fazer as pazes com a vida e encontrar paz de espírito, talvez não onde o esperasse. Todo este álbum é uma declaração de amor à primeira filha. Nas palavras dos Cult, "peace of mind is so hard to find, I wonder..."
Quando descobri o gótico, ou talvez quando o gótico me chamou, já lá vão uns aninhos valentes, senti que tinha chegado a casa. Onde quer que eu vá, basta-me entrar num buraco gótico para me sentir em casa. Mas não era deste mundo no meu universo que eu estava a falar há pouco. É de facto um universo, demasiado extenso para descrever aqui. O que importa é que consegui criar harmonia no meu universo interior.
Ainda não consegui fazer as pazes com a vida, mas já as fiz comigo própria.

Publicado por _gotika_ em 05:59 AM | Comentários: (0)


"No-people mood"

Foi como lhe chamou uma amiga de outras paragens.
O que me apetecia mesmo era isolar-me, ir para o alto de uma montanha onde não pudesse comunicar com absolutamente ninguém. Só eu, os meus animais, uma televisão, alguns livros, e de preferência muitas garrafas de vodka. Ou de vinho. Não importa.
Poderia passar as noites a ver televisão, ou a ler, podia apanhar grandes bebedeiras e ninguém tinha nada a ver com isso, podia dar-me ao luxo de não tomar banho durante uma semana, podia até dar-me ao luxo de ouvir música em altos berros. À minha volta só bicharada, pássaros incomodados e curiosos, ervas, árvores, pedras.
O que eu sinto é exactamente o contrário da solidão mas é curioso que não haja uma palavra para descrever este estado de ter companhia a mais.

Publicado por _gotika_ em 05:31 AM | Comentários: (2)


~~§~~

Comentário:
Hoje já começo a saber o que é esta solidão mas ainda não decidi quanto ao melhor nome para lhe chamar.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 20, 2003

Filmes

"Monster's Ball" é o filme mais intenso que vi nos últimos tempos. O fim, por outro lado, e à primeira vista, parece não estar à altura, parece inverosímel e decepcionante. Salva o final Halle Berry. Talvez por isso tenha ganho o óscar. Quando ela olha para as campas e depois sorri, quase se pode ouvir o seu pensamento: "Não adianta ficar agarrada ao passado. É preciso viver o presente".
Se virem o filme perceberão que no caso da personagem não é assim tão simples esquecer o que se passou... Não é mesmo assim tão simples! É por isso que a mensagem é tão forte. E Halle Berry passa a mensagem sem dizer uma palavra.

Publicado por _gotika_ em 10:01 AM | Comentários: (0)


Prazer da solidão

O que eu gosto mais nos weblogs é a possibilidade de falar sem que alguém responda. Ao contrário de trocar mails, conversar com os amigos ou participar em fórums, no blog podemos expressar a nossa opinião sem entrar em diálogo. Sabemos que eventualmente alguém vai ler. Eventualmente alguém vai comentar. Mas não é um diálogo. É também por isso que gosto de ler os blogs dos outros. É como ler um bom livro. Nem sempre te apetece conversar com o escritor.

Publicado por _gotika_ em 09:51 AM | Comentários: (1) 

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 19, 2003

Materialismo

Quando chegam a uma certa idade, geralmente depois dos 25 anos, certas pessoas estão tão desiludidas com os seus sonhos e com elas próprias que começam a tentar mostrar que são alguém porque têm dinheiro. Não têm mais nada para mostrar. Casamentos de merda, empregos que odeiam... De tão vazias, enchem-se de dinheiro para mostrar aos outros que não são ocas. Mas são. Ocas e feias.

Publicado por _gotika_ em 03:59 AM | Comentários: (4)

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Histórias da minha avó

Conto popular do Alentejo como me foi contado pela minha avó. Estava enterrado nos arquivos mas achei que fazia mais sentido publicar em separado.

História de Maria Garcia

Maria Garcia era uma mulher muito bonita a quem o padre, o seminarista e o sacristão andavam a fazer olhinhos. Todos os dias lhe perguntavam, os três:
- Maria Garcia, posso lá ir a casa esta noite?
Ao que ela respondia logo:
- Não, não pode! Está lá o meu marido!
Um dia a mulher chateou-se com o assédio e contou tudo ao marido. Este resolveu:
- Manda-os cá vir, manda! E diz-lhes que tragam dinheiro.
Assim fez Maria Garcia.
Há noite lá apareceram os três. O padre foi buscar o dinheiro à caixa de esmolas. O seminarista, que era novito, não tinha dinheiro mas levou um chouriço. O sacristão, que era um pobretanas, foi de mãos à abanar.
Quando o marido de Maria Garcia aparece, apanha os três em flagrante. Não só lhes confiscou os presentes como pôs o padre e o seminarista a andar à roda da mó do moinho da farinha. Ao sacristão, pô-lo de rabo para o ar, com uma vela enfiada no rego, a servir de iluminação.
No outro dia entra Maria Garcia na missa, com um vestido novo, e canta o padre:
- Lá vem Maria Garcia toda composta!
E canta o seminarista:
- À minha custa mais à vossa!...
E o sacristão:
- E eu como não tinha dinheiro, fizeram-me do cu candeeiro!

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Gotika: arquivos Dezembro 2003

dezembro 18, 2003

Under reconstruction

Nunca pensei que um diário online, pessoal e intimista, tivesse algum interesse para os outros. Sempre pensei que fosse a curiosidade, e não o interesse, que levava as pessoas a ler sobre a vida dos outros. Com certeza que também existe a curiosidade mórbida mas existe igualmente a escolha dos diários que lemos, os diários das pessoas que nos interessam.
Pergunto-me o que quero escrever aqui, e para quem. Não sei se escrevo para os amigos. Nem tenho a certeza se quero que os amigos saibam. Afinal, aqueles que merecem já sabem. Os outros, nao importa.

Ultimamente tenho sentido uma grande necessidade de solidão. Ao contrário de muitas pessoas, para mim é difícil estar sozinha. São muitas as solicitações. Parece que sou uma companhia agradável e tenho sempre assunto de conversa. Multiplicam-se os amigos e os conhecimentos. Torna-se difícil passar umas semanas sem os ver. Já para não falar nos amigos online. A única forma de os evitar é não abrir a caixa de correio.

Solidão, esse bicho temido, é aquilo que mais preciso. Sou um ser under reconstruction.
Veremos o que sai da metamorfose.

Publicado por _gotika_ em 06:14 PM | Comentários: (1)

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Gotika, no princípio...


A propósito de um comentário recente, descobri que o meu blog no Sapo, entre 2003 e 2004, foi apagado. Não sei se fui avisada porque com quase toda a certeza me esqueci de actualizar o endereço de email no perfil de utilizador e os emails que usava para efectuar o login foram também todos apagados por falta de uso.
Não fiquei surpreendida. Aquele blog não tornaria ser actualizado.
Para quem não sabe, este blog estava inicialmente alojado no Sapo, onde os períodos de indisponibilidade e bugs vários eram de fazer perder a paciência a um santo. Passados poucos meses assentei arraiais nesta morada do Blogger, que nesse sentido, apesar de alguns soluços aqui e ali, parece ser uma plataforma mais estável.


THANK YOU BLOGGER!!!



Mas não estou de facto surpreendida.  Prevendo essa eventualidade, fiz questão de guardar todas as páginas, todos os posts. (E os deste blog também, aliás, porque já não é o primeiro susto que apanho ao chegar aqui e não conseguir aceder!)  O que é de todo irrecuperável são os comentários, as discussões que os posts suscitavam, principalmente quando o tema era controverso, e muito especialmente quando se discutia o que é e não é o gótico. Tudo isso se perdeu, e é pena. (Podem verificar o número de comentários no final de cada post.)
Quanto aos posts originais, decidi voltar a publicá-los, aqui, nem que seja um por dia, pela reacção que causaram e as memórias que evocam e o muito que esclareceram e agradaram. Encontro citações minhas, por aí, sem saber que existiam. Já chamaram a esse blog “mítico”. Não mereço tamanho elogio, mas na altura o blog teve um certo impacto porque era o único a abordar o assunto abertamente. Havia, na altura, a ideia prevalente de que “o gótico nunca admite que é gótico”. Não sei se continua a haver mas, como devem calcular, se pouco me ralava na altura menos me rala agora.

Comecei esse blog, no Sapo, no dia 18 de Dezembro de 2003. Quando vi que estava apagado fui visitar os arquivos e comecei a ler. O que imediatamente me saltou à vista foi o quanto eu me estava a divertir a fazer aquilo. E como me apetecia partilhar, a melancolia, o bom humor, a ironia, os posts sérios, o humor dos testes “que personagem de Anne Rice és tu”… Por muitas razões, nem sei qual delas a maior, isso já não acontece. Já não me divirto, já não me apetece partilhar. Consequentemente, comecei escrever a menos. Porque é mesmo assim, os posts dão trabalho. E adivinho que já não devo concordar com muitas das coisas que pensava nessa altura. Adivinho que cada post necessite de um comentário actual.
Um blog tem necessariamente uma natureza efémera. Muitos posts não farão sentido e não serão publicados. Tentarei cingir-me ao que foi importante. Ao que é importante. Com ou sem motivo para um comentário actual.
Para os que leram desde o princípio, se ainda há por aqui alguém, espero que se divirtam como se divertiram naquele tempo. Eu tentarei apenas recordar, se tal é possível. Foi há muitos anos.
Naquela altura, o blog vestia-se assim:


Quando decidi voltar a publicar os posts do blog apagado tinha a impressão de que o blog tinha existido no Sapo durante muito menos tempo. Ao começar o trabalho apercebi-me de que ainda lá esteve de Dezembro de 2003 a Agosto de 2004. São muitos meses, muitos posts. Escrevi muito naquela altura. Muitos posts são curtos e publicados no mesmo dia, no estilo daquilo a que se chama hoje tweets (não havia Twitter): uma canção, um pensamento, uma frase. Podia publicar tudo? Podia, e demoraria meses. Tive de escolher. Tentei preservar os posts sobre a cultura gótica, as críticas de literatura e cinema, os posts sobre o estado do país. Mas este blog sempre teve acima de tudo o intuito de ser um diário pessoal (sempre teve por subtítulo Diário pessoal do terror quotidiano), e mantive alguns posts que ajudam a perceber como isto começou, mas a maioria de posts intimistas foram sacrificados. Quem me conhecia não altura leu, quem não conhecia não vai ler. Alguns posts, do ponto de vista do enquadramento psicológico em que foram escritos já não fazem sentido se não forem apresentados na sequência inicial. Esses foram cortados. Muitos diálogos também. O que passou, passou.