sábado, 10 de novembro de 2007

The Prophecy (saga)

"The Prophecy" é uma série de filmes daquilo a que gosto jocosamente de chamar "ficção religiosa". Ou, em termos certamente familiares aos leitores mais novos, uma espécie de "fan fic" em torno dos personagens angélicos da tradição judaico-cristã. É isso mesmo, os protagonistas da saga são anjos. Não são os querubins de S. Valentim, muito menos os anjos da guarda das criancinhas, nem sequer os anjos new age que respondem a preces e participam em curas astrais. Não. Estes são os anjos que vieram à Terra gerar em pecado os nefilins, os anjos que destruiram Sodoma e Gomorra, os mesmos que mataram os primogénitos do Egipto, e até os anjos que deixaram de o ser. "Todos os anjos são assustadores", diz-se no quarto filme, e a saga explica porquê.
Há uma guerra nos Céus, problemas no Paraíso. Algumas facções angélicas estão insatisfeitas com o favoritismo de Deus para com a sua criação terrestre e desejam voltar a ocupar o lugar que tinham "no princípio", antes de os seres humanos (mortais e imperfeitos) se terem tornado mais importantes no Plano Divino. Para atingir o seu fim, sem contrariar o Todo-Poderoso, tentam por isso conhecer e manipular as profecias apenas reveladas ao homem.


The Prophecy (1995)



Este é um filme que actualmente ainda se vê com interesse mas cujo arcanjo Gabriel de Christopher Walken não se consegue descolar da imagem do Exterminador Implacável, o que vem a ser corrigido nos filmes posteriores. Poderá ter sido um choque para os mais fundamentalistas quando o seu São Gabriel trata os humanos por "macacos" e desce à Terra para levar a alma de um general sem escrúpulos com o intuito de o fazer liderar os exércitos revoltosos que se preparam para travar a segunda guerra nos Céus. Para isso, não hesitará em matar quem se lhe atravessa pelo caminho, até a criança índia em quem a alma do tirano está aprisionada.
Um Lúcifer muito convincente interpretado por Viggo Mortensen (o "Aragorn" de "Senhor dos Anéis") reconhece a rebeldia e arrogância de Gabriel. É assim que o arcanjo, totalmente afastado da Graça Divina, é arrastado para o Inferno, e Lúcifer se torna um inesperado aliado dos humanos perplexos e desesperados. Sem dúvida a melhor parte do filme, esta reviravolta que lhe traz uma profundidade que se arriscava a não ter, e uma inversão de papéis que será de novo explorada à luz de um século XXI cada vez mais pessimista.


The Prophecy II, God's Army (1998)



Os arcanjos Miguel e Rafael enviam à Terra o anjo Daniel para conceber um nefilim que, segundo a profecia, está destinado a trazer a união entre anjos e homens e pôr fim à guerra que se prepara nos Céus. Conhecendo os seus planos, Lúcifer solta do Inferno o anjo Gabriel (dividir para reinar?), que imediatamente começa a perseguir a mulher grávida (Jennifer Beals). Ao tomar consciência do seu papel nas guerras celestiais, esta deixa-se conduzir até ao arcanjo Miguel que lhe confessa não a poder proteger do outro arcanjo.
É interessante como neste segundo filme não é o Diabo que intervém mas o Todo-Poderoso que, através da fé, faz saber o seu propósito. O anjo Gabriel é derrotado pela futura mãe do nefilim, sinal claro que Deus está do seu lado. Afastado do Céu e expulso do Inferno, Gabriel é condenado a viver na Terra, como humano, o pior castigo que poderia receber. E assim se salva mais um filme de cair na vulgaridade do Bem e do Mal.


The Prophecy III, The Ascent (2000)



O terceiro filme é, na minha opinião, o mais fraco da primeira trilogia. Retoma a história de Daniel, o nefilim, filho do anjo Daniel e de uma mulher, agora adulto e líder de uma seita que anuncia ao mundo que Deus abandonou a humanidade. Com a ausência de Gabriel, uma nova facção de anjos rebeldes surgiu nos Céus e pretende instaurar um novo Deus, Pyriel, "veterano" da guerra contra Lúcifer, mas a profecia diz que o nefilim Daniel o destruirá, pelo que o jovem se torna uma ameaça a ser eliminada. Depois de uma tentativa de assassinato mal sucedida, desce à Terra para tratar do assunto o anjo Zophael, criatura dúbia de lealdade incerta, que no fim se revela fiel a Pyriel, o novo Deus. A perseguição e constantes duelos entre Daniel e Zophael, com efeitos especiais tirados do "Matrix", podia estar muito na moda mas hoje já não se suporta os saltinhos e as correrias nas paredes. O filme ficou "passado".
Aproveita-se a grande interpretação de Christopher Walken, já não o exterminador implacável e angélico mas um velho decadente, cabeludo, barrigudo, viciado em todos os prazeres terrestres (até prostitutas), que já sabe conduzir e guia como um louco tocando a sua trombeta. É só por isso que vale a pena ver este episódio.
Quanto a Pyriel, que para personagem que aspirava a ser um novo Deus se finou num instante (o que é pena porque tinha uns lindos olhos azuis), penso que os argumentistas deram um passo maior que a perna.
Mais uma vez é a metáfora de Gabriel que salva o filme e lhe dá profundidade, pois só depois de largos anos a viver na Terra como os "macacos" que tanto despreza é que finalmente compreende o Plano Divino e é chamado de volta ao Céu.


The Prophecy IV, Uprising (2005)



Este filme regista nitidamente uma ruptura com os anteriores. O local é Bucareste, Roménia. A atmosfera é densa, europeia, cinzenta, soturna, por vezes apocalíptica, muito longe do espectáculo visual de Hollywood. É neste ambiente que um Satanás tão belo como frio (John Light) se faz passar por agente da Interpol na pista de um serial killer para se aproximar de um polícia corrupto com muitas culpas no cartório. Todavia, o que Satanás pretende desta vez não são (apenas) almas mortais, mas sim levar de volta para o Inferno o rebelde Belial (conhecido como o demónio da carne). Estes anjos são outros e também há guerra no Inferno. Belial pretende apoderar-se do Lexicon, um livro até então guardado por um velho padre local, onde está a ser escrito pela mão de Deus um novo capítulo do Apocalipse. Para os leigos na matéria, um novo capítulo da Revelação seria o acontecimento mais importante no cristianismo em 2000 anos! Com esta informação, Belial pretende criar um novo inferno, restaurar o equilíbrio, o preto no branco, em vez do cinzento tema que percorre todo o filme, a "ambivalência moral" nas palavras de Satanás, onde santos e diabos já não se distinguem.
Satanás, que desde a Queda não tem lugar no Plano Divino, ou assim parece, não mostra o mínimo interesse no livro e na sua profecia. Prefere estar na "cave" de castigo e divertir-se a ouvir as discussões dos irmãos preferidos do Pai como uma vingança servida fria. Para que nenhum anjo tenha acesso às profecias, protege a frágil Allison, guardiã do Lexicon, até obter o seu fim. E, parecendo sempre inofensivo, triunfa em todas as frentes.
Um pormenor politicamente curioso: a casa onde decorre parte da acção, que tinha servido de local de tortura à polícia secreta comunista, por ser palco de tantos horrores foi entregue pelo Divino como "pedaço de inferno na terra" ao domínio de Satanás. Dá que pensar. Dá muito que pensar.


The Prophecy V, Forsaken (2005)



Desta vez, é um serafim cujo nome verdadeiro nunca sabemos que vem à Terra à procura do Lexicon, onde se irá escrever muito em breve o nome do Anticristo que despoletará o Armagedão. Argumenta que quer intervir para evitar o genocídio, o Dia do Juízo Final ("a pior ideia de Deus"), e pretende eliminar a criança antes que esta se torne adulta. Mas para isso tem que encontrar Allison e convencê-la a entregar o livro. Movida pela fé no Plano Divino, Allison arrisca a vida para que o poderoso serafim não tome conhecimento da profecia, e para isso até recorre ao inimigo mais temível, Satanás, que já a tinha ajudado uma vez e que finalmente revela aos seus motivos. Ao contrário dos anjos celestiais rebeldes, que querem manter os humanos puros e justos fora do Paraíso, o que lhe interessa é encher o Inferno de escravos seus, e por isso tudo fará para que o Armagedão aconteça. Por algum tempo, Satanás é aliado do Plano Divino. O que também dá que pensar.
Toda a série de filmes "The Prophecy" foi classificada como cinema de terror mas, na minha opinião de habituée, exageradamente. Neste quinto episódio, contudo, garanto que há cenas arrepiantes até para o espectador mais vacinado. Direi mesmo que só não é mais assustador porque se sabe desde o princípio que a menina morta é uma mensageira de Satanás, o aliado da nossa heroína. Se isso é ainda mais arrepiante, à "Exorcista" mas post mortem, quem vir que decida.

7 comentários:

Penemue disse...

Tenho uma obsessão por nefilimos e pelo livro de Enoch.
Até ao terceiro The Profecy, achei aquilo o suprassumo, as minhas fantasias postas em tela.
Acho que vi aos bocados o tal do Serafim que vem á procura do Lexicon, mas aos bocados porque estava tão interessante que fui dormitando.
Sequelas...
O Christopher Walken como Gabriel é a escolha perfeita, adoro, adoro, adoro.
Não sei se me atreverei a ver os 4 e 5.
Gostei demasiado dos anteriores.

Abraço

katrina a gotika disse...

Eu gostei mais dos dois últimos.

Goldmundo disse...

Lol, nem sabia que isto existia. Tomo nota :P

Desde o murro do Shwarzenneger em Satanás (como se chanmava aquilo?) fiquei fâ de filmes de bang-bang angélicos ;)

Penemue disse...

"Os Dias Do Fim".

Valeu pelo Gabriel Byrne no papel do Demo.

Um filme engraçado, mas há melhores. Gosto muito do Stigmata.

Abraço

Goldmundo disse...

Isso mesmo, "dias do fim" :)

É curioso que, de facto, os temas dos filmes oscilam quase sempre entre o estilo "Inland" (não vi, mas conhecendo o Lynch a descrição da Gotika faz todo o sentido) e o estilo "igreja católica guarda terrivel segredo há mil anos e poderoso demónio ameaça libertar-se no subterrâneo de capela em Chicago".

O Exorcista foi um dos poucos que a tanto escapou. E o "Jesus" do Mel Gibson. Enfim, resta a literatura...

:)

katrina a gotika disse...

Gold, eu também não sabia desta saga até há muito pouco tempo.


à parte -- É incrível, com tanta merda que as pessoas sugerem que eu veja e nunca ninguém falou nisto!

AMIGOS! Isto é que me interessa! Vejam se apanham a onda! -- fim do à parte

Esta saga é diferente, Gold, porque não é a igreja que detêm o segredo. A igreja aqui é mais um joguete nas mãos dos seres angélicos. Há muitas contradições, infinitas contradições, mas os filmes são para americanos. Os últimos são melhores, o que prova que se podia intelectualizar mais a coisa. Mas não ao ponto de cair no extremo dos anjos do Wim Wenders, porque saiu uma inominável seca e como é costume nos filmes europeus reduziu-se tudo à carne e ao truca truca. Nisso, os europeus são tão ou mais básicos do que os americanos, e também me desgosta.

Anónimo disse...

bom... nao achei os anjos sombrios, e nem se quer achei q o filme deveria ser classificado como terror e suspense... mas blz, os filmes sao otimos e representam os anjos mt bem!
assistam q vale a pena!!