quinta-feira, 4 de novembro de 2004

Exorcismo

I have nightmares
thinking about
getting together with you


Violent Femmes
Nightmares


Eu também já fui humana. Houve uma altura na minha vida em que o amor era importante. Não, em que o amor era tudo. Não havia mundo para mim sem o amor e a pessoa que eu amava.
Não há grande doença sem grande cura. Quando acabou, descobri-me imunizada.
Actualmente não procuro, não penso nisso, não me preocupa minimamente.
Mas é principalmente nas alturas de maior ansiedade que tenho o sonho em que o encontro, em que conversamos e tentamos voltar a ficar juntos. Como sempre, vêm ao de cima as nossas diferenças inconciliáveis e acabamos a discutir. Ou pior, ficamos juntos mas contrariados, como se estivéssemos condenados a partilhar a vida um do outro. Acordar é um alívio. E quando acordo nem acredito que sonhei...
... contigo.
Passam-se semanas e semanas, direi mesmo meses e meses, em que não me lembro que exististe. Às vezes são as palavras dos outros, quando falam de amor, que me obrigam a pensar em ti. De outro modo nem sei do que raio estão a falar. E olha que é um esforço de memória ter de me recordar de ti, daquilo que significava ficar contigo, do que eu sentia por ti.
Não percebo porque apareces nos meus sonhos. É mais uma versão dos sonhos em que estou em conflito, e desses tenho muitos. Mas não percebo porque hás-de aparecer nos meus sonhos se estás tão definitivamente enterrado. Não sei onde moras nem com quem. Possivelmente podia passar por ti na rua e não te conhecer.
E tu, tenho a certeza de que tu podes até reconhecer a minha cara mas a pessoa... a pessoa que tu conheceste já não existe. Tenho a certeza que poderias até estar a ler este blog e não me reconhecerias.
De modo que o que vou fazer é arriscado. Mas não te imagino a ler blogs, nem coisa nenhuma. Imagino-te demasiado ocupado a fazer dinheiro, que foi aquilo que sempre amaste.
(Por falar nisso, já compraste uma vivenda para a mamã? Não, claro que não. Cá se fazem, cá se pagam.)

Tu é que disseste que gostavas desta canção, lembras-te?
Nesse preciso momento em que o disseste, eu tive um mau pressentimento. Não podias gostar desta canção! Não tinhas experiência para gostar desta canção! A não ser, talvez, em imaginação. Terias já imaginado tudo? Actualmente eu presto tanta atenção a esses pequenos pormenores que antes de me apaixonar já me desiludi. Nessa altura ignorava os meus pressentimentos. Agora não. Mas nessa altura, por amor a ti, ignorava-os.
Cá está a tua canção. Nunca te neguei as pequenas vontades:


Do you remember chalk hearts melting on a playground wall
Do you remember dawn escapes from moon washed college hall
Do you remember the cherry blossom in the market square
Do you remember I thought it was confetti in our hair
By the way didn't I break your heart?
Please excuse me, I never meant to break your heart
So sorry, I never meant to break your heart
But you broke mine

Kayleigh is it too late to say I'm sorry?
And Kayleigh could we get it together again?
I just can't go on pretending that it came to a natural end
Kayleigh, oh I never thought I'd miss you
And Kayleigh I thought that we'd always be friends
We said our love would last forever
So how did it come to this bitter end?

Do you remember barefoot on the lawn with shooting stars
Do you remember loving on the floor in Belsize Park
Do you remember dancing in stilettoes in the snow
Do you remember you never understood I had to go
By the way, didn't I break your heart
Please excuse me, I never meant to break your heart
So sorry, I never meant to break your heart
But you broke mine

Kayleigh I just wanna say I'm sorry
But Kayleigh I'm too scared to pick up the phone
To hear you've found another lover to patch up our broken home
Kayleigh I'm still trying to write that love song
Kayleigh it's more important to me now you're gone
Maybe it will prove that we were right
Or ever prove that I was wrong

Marillion
Kayleigh


Passados mais de dez anos, agora posso dizer com toda a segurança que eu tinha razão.
Não que importe. Bem, a parte de ser substituída por um apartamento foi venenosa, acredita, e o veneno foi fatal. A pessoa que tu conheceste, de facto, morreu.
A pessoa que eu sou hoje jamais trocaria duas palavras contigo.
Nem imaginas a quantidade de "tus" que tenho encontrado por aí aos pontapés!
Como tu sabes tão bem, nesta vida há os que se compram e os que se vendem. Eu prefiro ficar fora do mercado. É uma opção. Não se venham depois chorar. Não tenho pena nenhuma.
Um apartamento vale o que vale. E ainda por cima tende a desvalorizar-se. É tudo uma questão de investimento.
Há pessoas que se metem no mercado de valores. Consequentemente, também se desvalorizam, certo? É apenas óbvio. Pessoa, mercadoria, valor, troca, compra, venda, transacção, contrato a termo certo.
Eh bien.

Agora me lembro. O meu número de telefone mudou. Nem sequer existe. Agora tenho telemóvel e e-mail. Coisas que não existiam no nosso tempo. Coisas muito mais práticas, de facto.
Talvez queiras saber a minha morada?


So if you want my address it's number one at the end of the bar
Where I sit with the broken angels clutching at straws and nursing our scars
Blame it on me, blame it on me,
Sugar mice in the rain


Marillion
Sugar Mice


Sim, podes culpar-me a mim. Eu sempre fui fria por fora. Actualmente não perderia cinco minutos a explicar-te que é para dentro que deves olhar. E não estou a falar do número de assoalhadas. Mas, se quiseres continuar a metáfora - espera, tu não sabes o que é uma metáfora! - a comparação, dizia eu, qualquer casa em ruínas tem mais dignidade que um andar novo nos subúrbios. Principalmente quando não foi adquirida a subir em escadas de cadáveres.
Lembras-te? Palavras tuas: "Quanto maior o monte de cadáveres, mais alto se sobe".

Agora que já falei de ti, espero que desapareças. Da minha mente já saíste há muito tempo. Agora sai dos meus sonhos. Não apareças nem nem num cameo role como vendedor de gelados na praia. É mesmo para saíres.

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